
Confesso, não era fã da cantora e compositora goiana Marília Mendonça, que nos deixou no último dia 05, em trágico acidente de avião, em terras mineiras.
Com seu estilo musical na linha sertaneja universitária, voz forte e grave, Marília cantou como ninguém as dores femininas nos relacionamentos amorosos, sobretudo as paixões não correspondidas.
Fato é que Marilia tinha uma veia artística bem definida em suas composições, de acordes simples, mas bem estruturados melodicamente.
As letras de suas canções espelham o viver de muitas mulheres, iludidas ou traídas nos seus relacionamentos a dois. Marília levou isso ao palco e, assim, ganhou milhares de fãs, inclusive masculinos.
A linha estética do estilo musical escolhido por Marília, como disse no início desse artigo, não me apraz. Mas gosto não se discute. Cada um sente de uma maneira e escolhe o que quer ouvir. Conheço muitas pessoas que não curtem Caetano, Gil, Milton, Chico, João Bosco, entre outros músicos e compositores que considero a essência da nossa Música Popular Brasileira.
Aqui cabe um parêntese. As composições que Chico Buarque fez e faz são extremamente bem elaboradas no campo harmônico, sem falar da qualidade poética nas suas letras, com conteúdo social que expõe aspectos da vida urbana, conjugais etc. Chico, talvez, seja o compositor que melhor tenha retratado a alma feminina em suas canções.
Veja a letra de “Olhos nos olhos”: ‘Quando você me quiser rever/ Já vai me encontrar refeita, pode crer/ Olhos nos olhos, quero ver o que você faz/ Ao sentir que sem você eu passo bem demais...’.
Chico Buarque, ao cantar sobre a mulher, revela-se um homem que fala sobre o sexo oposto, e outro acontece quando canta como se fosse uma mulher exprimindo aquelas palavras, o que revela a mulher interior do artista.
Gilberto Gil, outro gênio da nossa MPB, também expõe a importância da mulher. Compôs “Super Homem, a canção”, cuja letra é um ode à alma feminina. “Um dia vivi a ilusão de que ser homem bastaria/ Que o mundo masculino tudo me daria/ Do que eu quisesse ter.../Que nada/Minha porção mulher, que até então se resguardara/ É a porção melhor que trago em mim agora/ É que me faz viver”...
Registrado o parêntese, penso que para os fãs da cantora que começou a compor aos 12 anos de idade ficará um vazio, mas a certeza que ela cumpriu bem seu papel enquanto aqui na terra.
Agora, em outra esfera, Marília descansará na paz eterna, longe da sofreguidão que é este mundo de meu Deus, ainda dominado por muitos homens gananciosos, opacos, obscuros e insensíveis a uma paixão muitas vezes arrebatadora, vindo do coração de uma mulher sagrada, como diria Caetano em uma de suas canções.
A sofrência tão decantada por Marília continuará permeando por aqui. O mundo masculino ainda não absorveu a essência da alma feminina, oxalá que um dia isso possa acontecer.