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Gosto de palavras


No princípio, Deus criou os céus e a terra. (...) Deus disse: “Faça-se... e tudo foi feito. (Gênesis 1:1 e 3)


No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. (João 1:1)

Na epígrafe, sinaliza-se a importância das palavras. Sou professora de Língua Portuguesa - um código com regras e normas - e também professora de Literatura - a arte da palavra. Por isso incomodam-me muito as formas de comunicação utilizadas atualmente. Ouço, leio, entendo e abomino. Jogos de palavras, trocadilhos infames, construções de frases que ao invés de esclarecerem apenas iludem. Perverteu-se o objetivo da comunicação: não é mais para informar e sim para enredar, complicar e enganar.


É senso comum, todo ser humano se diferencia dos animais ditos irracionais pela linguagem. Normalmente usamos palavras para nos comunicarmos, falando ou escrevendo. Com o acesso às redes sociais e TV aberta, a comunicação falada ou escrita cresceu muito, em volume, mas não em qualidade ou objetividade.


Os especialistas afirmam que qualquer texto falado ou escrito origina-se de um indivíduo, com personalidade, conceitos e crenças, inserido em um espaço social e que quando se manifesta expressa o que pensa, o que entende ou o que acredita entender e tem sempre um propósito a alcançar.


Atentando para os comentários nas redes sociais é assombroso ver como todas as pessoas se acham conhecedoras de todos os temas, de todos os assuntos. Opinam, elogiam e debatem sobre qualquer assunto. Escarnecem, ofendem e ironizam qualquer afirmação, levando o emissor a emoções desagradáveis e/ou sofrimento.


Quem nunca expôs um simples comentário no facebook, assunto sem importância, escreveu sem malícia ou sem premeditação? De repente, a postagem é lida por alguém ferido pela vida ou com a alma envenenada pela inveja ou pela maldade e imediatamente o assunto se torna o gatilho para ofensas, para ironias agudas, suscita bastidores, expressa causas, relações absurdas, enfim, forma-se um emaranhado de ideias e palavras que se coordenam e se reorganizam, assumindo um caráter de maldade que fere e leva o primeiro emissor ao arrependimento e sem condições de esclarecer a ideia inicial. E os seres humanos evoluem para a barbárie com base na comunicação.


Basta acompanhar as legendas das postagens, sejam quais forem, e, sem esforço, percebemos o jogo de palavras que se tece para enredar o leitor na maldade ou na mentira. Inúmeras são as legendas que evidenciam uma informação e ao lermos o texto percebemos a controvérsia e a manipulação dos fatos narrados.


Um amigo querido, certa vez me disse: “Pior que uma mentira, é uma meia verdade!” Comprovei isso em vários momentos da minha vida profissional e esse dito é perceptível na comunicação atual. O que se diz ou se escreve tem um elemento de verdade mas complementos de falsidade graves. Uma afirmação que lemos hoje na internet ou em um jornal impresso, amanhã assume outra característica, outro desdobramento não pelo decurso natural dos fatos, antes por desejos inconfessáveis da fonte. Um mesmo fato veiculado de diferentes formas, com diferentes palavras e diferentes destaques levando os leitores e ouvintes mais ingênuos ao entendimento pretendido por quem veicula a informação. O jornalismo se afasta de seu objetivo primordial que é informar e tece comentários e justificativas que não cabem ao jornalista, claramente direcionando o entendimento da maioria que se acostumou ao longo dos tempos a acreditar “se deu no rádio ou na televisão, então é verdade”. Santa ingenuidade!


E seguimos nós, um país de alto índice de analfabetos ou analfabetos funcionais à mercê dos interesses escusos e das falsas legalidades forjadas para controlar e se tornar crível apesar dos lamentáveis e execráveis interesses.


E assim a palavra que serviria para promover o entendimento, a paz e o amor, na verdade é manipulada, distorcida vilipendiada e passa a promover o caos, a discórdia, o desassossego, a insegurança, a infelicidade.


“As palavras têm a leveza do vento e a força da tempestade”. (Victor Hugo)


(*) Aldora Maia Veríssimo - Presidente da AVL

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