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Nada é ‘Para sempre Alice’!

Atualizado: 20 de jun.



“Para sempre Alice”, livro escrito pela neurocientista americana Lisa Genova, impregnado da experiência com a avó, que morreu com Mal de Alzheimer, foi objeto de discussão do Clube de Leitura da AVL.


Alice Howland, renomada pesquisadora de Linguística, da Universidade de Harvard, tem apenas 50 anos quando é diagnosticada com Mal de Alzheimer. Ela possui um tipo raro da doença, desencadeado por uma mutação genética hereditária. Alice dedicara sua carreira ao estudo da fala e da comunicação. Sua memória afiada era motivo de admiração e orgulho. Os sintomas se anunciaram gradativamente.


O primeiro lapso da memória de Alice, durante uma palestra, foi o termo “léxico”. Estresse ou menopausa? Alguns dias depois, Alice se perde ao retornar de sua corrida diária pelo campus onde lecionava. Vai ao médico e depois de uma série de exames, incrédula e revoltada, é diagnosticada com Mal de Alzheimer precoce.


Muito segura de suas escolhas, Alice acreditara que sempre poderia estar no controle de sua vida, sempre “senhora de si” e, ironicamente, descobre que “nada é para sempre”. Sua memória é atropelada por uma doença degenerativa e incurável. Percebe que terá que abrir mão do controle, aprender a se deixar cuidar e conviver com uma única certeza: a de que, em pouco tempo, não seria mais a mesma. Pesquisa o assunto e tenta criar dispositivos de “sobrevivência da memória”.


Como a causa de sua doença é hereditária, cada um de seus filhos tem 50% de probabilidade de ter herdado o gene defeituoso e, assim, desenvolver o Mal. A caçula, Lydia, decide não fazer o exame genético; Tom, o do meio, descobre que não carrega a mutação; mas a primogênita recebeu o gene defeituoso e é praticamente certo que desenvolverá a doença. Quando faz a descoberta, Anna está passando por um tratamento para fertilização “in vitro” com o objetivo de engravidar.


Alguns relatos são impactantes. Tentando conviver com a doença, Alice é vítima de momentos de sofrimento indescritível. Certa feita, viaja para ministrar uma palestra e deixa-se ficar na plateia esquecida do que viera fazer ali. Em outro momento, vai à Universidade para seu horário de atendimento aos alunos de pesquisa e estranha a ausência dos jovens que passam pelo corredor mas não entram. Preocupada, volta para  casa, e ao passar em frente ao espelho do hall não se espanta, mas a imagem refletida ostenta a camisola de dormir. Convidada pelo marido para fazerem juntos uma caminhada, resolve ir antes ao banheiro e, desesperada, não identifica a porta; abre várias que dão para armários ou para salas e quartos; quando o marido retorna para chamá-la, Alice está chorando e suas calças estão molhadas.


Os lapsos de memória seguidos de momentos de lucidez dão à personagem o entendimento da cruel e irreversível situação pela qual está passando sem que nada possa ser feito para minimizar ou postergar a enfermidade. A Medicina ainda não dispõe de informações para tal.


É angustiante a descrição progressiva da deterioração mental de Alice e  lento o desenrolar do implacável pesadelo. É uma contínua e inexorável perda de si mesma. O fato de Alice ser uma intelectual torna a progressão de sua doença mais tocante. Os detalhes mais comoventes estão nas suas desesperadas tentativas de não perder completamente o controle de sua vida, criando lembretes, gravações no celular, recados escritos; mas há um desespero enorme por trás de cada esforço, que a autora, felizmente (?) não tenta aliviar.


O mal avança. A filha caçula torna-se a protetora da mãe em franco processo de aniquilamento: deixar de ser quem foi um dia! A história serve como reflexão. Com ou sem doença, devemos aproveitar ao máximo cada momento de nossas vidas. Amanhã, tudo poderá ter desaparecido!


– Meu cérebro já não funciona bem, mas uso meus ouvidos para uma escuta incondicional, meus ombros para que chorem neles e meus braços para abraçar outras pessoas com demência. (Para sempre Alice, p. 240)


(Texto original publicado em 22/06/2017)


(*) Aldora Maia Veríssimo – Presidente da AVL

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