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'Pensavam que era dengue, mas leucemia já havia tomado 93% da minha medula'

Com Uol


A cidade de Campo Grande (MS), onde mora Tallita Knebel, 29 anos, viveu um surto de dengue em outubro de 2022.


Nessa época, por brincadeira, a técnica de enfermagem deixou uma amiga enfermeira fazer nela um teste do laço —exame que permite identificar a fragilidade dos vasos sanguíneos, realizado em casos suspeitos de dengue.


"Na hora que minha amiga fez a prova, meu braço se encheu instantaneamente de manchinhas vermelhas", lembra Tallita.


A colega a orientou a fazer imediatamente o teste para confirmar o diagnóstico em uma UBS. Mas Tallita decidiu aguardar e só buscar atendimento médico caso tivesse febre ou outros sintomas de dengue.


Após alguns dias, a técnica de enfermagem piorou: sentiu febre, dores no corpo e fraqueza. Chegou ao ponto de não conseguir comer. Mesmo doente, não procurou um médico e foi fazer a prova prática para tirar habilitação de moto.


"Fui tão mal que, no fim do circuito, achei que não tinha passado. Liguei para a minha mãe chorando muito e, ao desligar a chamada, desmaiei", relembra a auxiliar de enfermagem.


Talitta foi levada ao hospital e realizou uma série de exames, mas foi mandada para casa porque o local estava cheio.


"No outro dia, quando voltei ao hospital, eles já estavam me esperando e a enfermeira disse que eu deveria avisar alguém da minha família, pois teria de ser internada", lembra. A principal suspeita médica era de que estava com dengue hemorrágica.


Da dengue ao câncer

Tallita fez uma série de exames. Nesse meio tempo, as manchas vermelhas pelo corpo continuavam a aparecer junto com hematomas, além de ela estar pálida e sem forças até mesmo para andar.


O caso foi transferido para a área de hematologia. Ainda internada, Tallita passou por mais uma longa semana de exames até que os médicos chegaram ao diagnóstico de leucemia linfóide aguda, tipo B.


"Estava com 93% de comprometimento de medula. Fui considerada basicamente morta. Nenhum médico achou que eu iria conseguiria sair do hospital. Precisei receber 50 transfusões de sangue e plaquetas na primeira internação", relata.


Por que a leucemia pode ser confundida?

A infectologista Sigrid de Sousa dos Santos, diretora da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia), explica que a interpretação médica sobre os sintomas que Tallita Knebel apresentava ser de dengue e não de um câncer é esperada.


Além de as duas doenças terem sintomas semelhantes, a probabilidade é maior de uma arbovirose levar a uma doença febril aguda do que uma enfermidade neoplásica, como a leucemia.


O que é a leucemia linfoide

O hematologista Guilherme Perini, do Hospital Israelista Albert Einstein, explica que para entender a leucemia linfóide aguda é preciso conhecer a funcionalidade das células tronco dentro da medula óssea.


Elas são responsáveis tanto por produzir quanto por repor todas as células do sangue como hemácias, plaquetas e glóbulos brancos.


"Nas leucemias agudas, as células tronco da medula óssea sofrem mutações e proliferam descontroladamente, além de perderem a capacidade de gerar células maduras funcionais", esclarece.


A partir disso, o paciente apresenta queda nas contagens das hemácias, plaquetas e glóbulos brancos e, consequentemente, os sintomas associados começam a surgir.


Os principais são:

  • Febre;

  • Cansaço;

  • Manchas vermelhas pelo corpo (petéquias);

  • Dores ósseas;

  • Sangramentos;

  • Infecções;

  • Anemia.

O diagnóstico da leucemia linfóide aguda começa por alterações significativas no hemograma, mas só vem a ser confirmado com o estudo da medula óssea, chamado de mielograma, como o que Tallita fez.


Tratamento é difícil

O tratamento para a leucemia linfoide aguda é quimioterápico e foi por ele que a Tallita precisou passar logo após receber o diagnóstico da doença.


A técnica de enfermagem fez oito ciclos de quimioterapia. Em cada um, ficou cinco dias internada e mais 28 em casa, se recuperando da bomba medicamentosa. No fim do tratamento, ela não tinha eliminado a doença completamente, o que a impediu de passar pelo transplante de medula óssea pelo SUS.


Em janeiro deste ano, mesmo com a leucemia ativa, Tallita conseguiu realizar o transplante de medula de óssea em um hospital particular, via convênio médico. A doadora 100% compatível foi a sua irmã.


"O transplante foi uma alternativa para eu não ter um aumento muito grande da doença, a ponto de ficar como foi no início. Quando eu fiz a cirurgia, a leucemia tinha retomado 10% da medula, porque a medicação já não estava mais fazendo efeito", relata.


Atualmente, ela "está com 0,0084% de leucemia" e pode acabar não entrando em remissão completamente devido à mutação cromossômica filadélfia que possui e que foi descoberta após entrar no plano de saúde.


Essa mutação consiste em uma troca de uma parte do cromossomo nove pelo 22 e vice-versa. Isso resulta em um prognóstico pior para os pacientes com leucemia.


Ainda assim, há tratamento para o problema, mas o preço é alto. Cada caixa do medicamento custa R$ 14 mil e Tallita precisa tomar uma por mês. Isso faz com que ela dependa de rifas, doações e de toda forma de ajuda para custear o remédio que é a sua esperança de que o câncer entre em remissão.


"Eu me sinto assustada com tudo isso. A remissão, caso venha, irá demorar devido à mutação. Fico pensando se vou trabalhar logo ou não, na minha filha e em todo o resto", desabafa.

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