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“Grande Sertão: Veredas” é um romance modernista da 3ª fase, escrito por João Guimarães Rosa, em 1956. É um dos mais importantes livros da literatura brasileira e integra a lista dos cem melhores livros de todos os tempos.
Extremamente erudito, Rosa incorporou em sua obra aspectos de diferentes culturas. Segundo Alexei Bueno, é uma das três epopeias da língua portuguesa, somando-se a “Os Lusíadas”, de Camões e “Os Sertões”, de Euclides da Cunha.
A obra se passa no sertão brasileiro, em parte dos estados da Bahia e de Minas Gerais. Alguns lugares citados são reais, mas boa parte é fruto da imaginação do autor. Para a construção da obra foram realizadas duas viagens: em 1945, vai ao interior de Minas Gerais rever as paisagens de sua infância, e em 1952, acompanha a condução de uma boiada pelo sertão mineiro.
A narrativa não é linear, mas pode-se depreender dela a história de Riobaldo em um discurso de autoconhecimento; revelando o sertão, revela-se a si próprio, como se dissesse “o sertão sou eu” reiterado em “O sertão está dentro de nós”.
Utilizando-se amiúde do fluxo da memória, o narrador retoma sua vida e narra as grandes lutas dos bandos de jagunços, descreve as características de diversos personagens (Joca Ramiro, Hermógenes, Zé Bebelo, Ricardão…) e revela códigos de honra do sertão, confrontando as forças do bem e do mal, os pactos com o Demo, a existência de Deus e do Diabo. Conhecendo o bando de jagunços de Joca Ramiro, através de seu padrinho, Riobaldo percebe que seu lugar é junto aos jagunços.
Seguem-se batalhas e desavenças entre os vários bandos que cortam os sertões, demonstrações de valentia, solidariedade, crueldade e até justiça. O amor permeia esse universo na figura das mulheres da vida, que não negavam aos jagunços a beleza e o prazer de seus corpos.
Nessas idas e vindas, Riobaldo reencontra Reinaldo/Diadorim, um personagem que conheceu na infância. Percebe que existe entre eles uma relação diferente da que podia haver entre jagunços. Diadorim representa a dubiedade: o masculino e o feminino, o celeste e o demoníaco, a certeza e a dúvida. Diadorim era sério, “não se fornecia com mulher nenhuma”. Destemido, calado, de feições finas e delicadas, impressionava Riobaldo e exercia sobre ele grande fascínio: em vários momentos, o jagunço entende que o ama, embora não visse lógica nesse sentimento.
Os sucessivos confrontos entre os bandos que simbolizavam o bem X mal, alternâncias de comando, o julgamento de Zé Bebelo, comando nas mãos de Riobaldo, morre Joca Ramiro. O sofrimento de Diadorim sinaliza algum vínculo sanguíneo entre o doce jagunço e o respeitado chefe Joca Ramiro.
Comandando o bando, Riobaldo, tenta pactuar com o Demo, em uma encruzilhada, em noite escura. Diadorim que tinha como objetivo vingar a morte do pai, em sangrento duelo, mata Hermógenes, mas é ferido mortalmente. Morrendo Diadorim, ao ser preparado para o enterro, descobre-se ser uma mulher. O sofrimento de Riobaldo é indescritível.
Após o trágico fim de Diadorim, Riobaldo desiste da vida de jagunço e adota um comportamento regrado, orientado pelo seu compadre Quelemém. Casa-se com Otacília e recebe duas fazendas de herança, assumindo, assim, a condição almejada de “homem definitivo”.
O lançamento de “Grande Sertão: Veredas”, impactou o cenário literário brasileiro. O sucesso do livro, traduzido para diversas línguas, foi devido, especialmente, às inovações formais. Tornou-se um sucesso comercial, recebendo vários prêmios.
Além da técnica e da linguagem surpreendentes, deve-se destacar a aguda análise dos conflitos humanos universais contextualizados propositalmente em um ambiente regionalista. A linguagem inovadora que mistura regionalismos, neologismos e arcaísmos singularizam uma obra de alcance mundial, afinal ‘O sertão é o mundo’. O sertão é “onde o pensamento da gente se forma mais forte que o poder do lugar”.
A aridez sertaneja, enfatizada sobretudo pela linguagem visceralmente regionalista, contrasta com a dimensão universal da narrativa de Riobaldo. Homem e mundo, realidade e devaneio, mundano e divino, são aspectos de um mesmo conflito, exaustivamente contemplado pela literatura universal, evidenciando-se sutil intertextualidade.
O Mestre Antonio Candido defende que “na extraordinária obra-prima “Grande Sertão: Veredas” há de tudo para quem souber ler, e nela tudo é forte, belo, impecavelmente realizado. Cada um poderá abordá-la a seu gosto, conforme o seu ofício”.
(*) Aldora Maia Veríssimo – Presidente da AVL