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Uma tragédia


O dia era 26, terça feira. Todos, desde o escurecer, como sempre, haviam se recolhido aos seus leitos para o devido descanso após intenso dia de trabalho. O calor estava escaldante, difícil dormir um sono profundo e ininterrupto. Passavam poucos minutos das 3 horas da madrugada. O sono de vários foi incomodado por ruídos desconhecidos. Ventania? Um ciclone? Estouros? Telhas sendo deslocadas? Difícil entender, mas o fenômeno foi acordando gradativamente uns e outros. Em minha rua alguns já estavam acordados, consequência do calor, “tomar um ar na calçada” ou, a tranquilidade típica dos jovens refrescando-se com um delicioso tereré.


De repente vários, acordando, e saindo à janela ou portão, foram fustigados pelo que estava acontecendo: havia fogo nos barracões/depósitos de uma empresa localizada em nosso quarteirão. Uma empresa próspera, cujos depósitos atravessavam o quarteirão de uma a outra rua. Vários, interligados, possibilitando uma viela confortável para a propagação do fogo, ajudado, certamente pelo calor altíssimo.


Foi dado o alarme: campainhas tocando, portões sendo chacoalhados e vizinhos desesperados, gritando: Saiam, saiam para fora, o fogo pode chegar até sua casa!

Em poucos minutos, o fogo propagava-se pelos corredores dos depósitos e as labaredas altíssimas, apontavam acima de nossos telhados e lambiam nossas edículas e nossas paredes mais próximas.


Vários chamamentos para o Corpo de Bombeiro. Um tempo que nos pareceu enorme. Todos na rua, na calçada, olhando as labaredas lambendo as paredes e propagando-se céu acima, atingindo além dos barracões, as árvores e arbustos dos quintais próximos. Percebi, com horror, que fogo faz barulho, e parece impossível controlá-lo. Mãos postas, lábios balbuciando pequenas preces e uma onda de solidariedade. Muitos dos funcionários da empresa chegavam assustados, propondo-se a ajudar; os proprietários, como autômatos, sem saber o que fazer, sentindo, provavelmente uma angústia indescritível.


Vizinhos e curiosos dispunham se nas calçadas e nos cruzamentos próximos. Parte do quarteirão voltado para a avenida ardia seguido pelos barracões voltados para a outra rua... eis que percebemos que o fogo chegava ao barracão da rua onde moro! Próximo da minha casa!


Viu-se então uma mobilização enorme; quase todas as pessoas ali paradas puseram-se a tirar do barracão o material guardado para que não fosse queimado e não alimentasse mais o fogaréu, já que eram materiais inflamáveis. E assim se deu. Tudo foi retirado, rapidamente, e não consumido pelo fogo, exceto um caminhão baú cuja chave não foi localizada.


A vida se compõe de paradoxos. Numa noite calma como muitas outras, fomos surpreendidos por uma tragédia: um incêndio destruindo em pouco tempo o resultado de muito trabalho sério; muito medo e pavor nos moradores mais próximos; medo de que nossas casas fossem atingidas por fagulhas incontroláveis; e ao mesmo tempo emergiu dessa infelicidade um movimento de solidariedade de pessoas que nem bem se conheciam, mas se uniram para tentar amenizar a dor do próximo. Lindo de ver! Parafraseando uma fala de Adriles Jorge, jornalista, “não há ninguém que não tenha dentro de si traços de bondade, traços de solidariedade, traços próprios dos filhos de Deus”.


Os bombeiros vieram, o caminhão tanque e funcionários da Prefeitura também se fizeram presentes. Para quem estava observando e rezando, vendo o fogo se alastrar, o atendimento sempre parece demorado demais. Mas, enfim, o fogo foi apagado, algumas casas, por segurança foram interditadas e, apesar do cheiro de queimado, a vida foi voltando ao normal.


Nunca imaginei ver o perigo tão de perto. Para mim e meus vizinhos, tal evento jamais fora cogitado. Mas, a história se cumpre, apesar de nossos desejos.


Resta-nos agradecer a Deus, porque apesar das perdas materiais, ninguém se feriu, ninguém se queimou. Que Deus ajude a família atingida a recuperar o que perdeu. E com certeza, tal experiência marcou profundamente a todos, menos ou mais afetados. E ouso dizer, apesar do sinistro, “o mundo ainda tem jeito!” Que Deus abençoe a todos!


(*) Aldora Maia Veríssimo - Presidente da AVL

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